piadas sobre estupro

Todos devem se lembrar de, ao menos, uma das várias polêmicas envolvendo o comediante Rafinha Bastos. A mais famosa, sem dúvida, envolve o comentário que ele fez em relação à Vanessa Camargo. (descobri que, na verdade, ela se Wanessa e, ainda por cima, sem o Camargo. Continuará sendo Vanessa Camargo, para que haja lastro de identidade). O comentário ficou tão famoso que, mesmo sem reproduzí-lo, tenho certeza que todos lembram.

Outro momento polêmico dele foi sobre o estupro, durante um show de stand up. Segundo a revista Rolling Stone, a piada foi a seguinte:

Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra caralho. Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, e sim uma oportunidade. Homem que fez isso não merece cadeia, merece um abraço.(Revista Rolling Stone, Ed. 56, Maio/11 - http://goo.gl/D2ruR)


O discurso que a piada traz a tona é que o estupro só pode ser considerado um crime hediondo se for cometido contra mulheres bonitas. Se a estuprada for uma muher feia, o crime deixa de ser considerado como um ato contra a mulher mas como um ato de generosidade para a mulher. Para nós, as mulheres feias (e fica a pergunta: o que seria uma mulher feia?) têm raríssimas oportunidades de ter prazer sexual e o estupro é um momento que não deve ser desperdiçada. Quanto ao estuprador, ele deixa de ser criminoso e passa a ser um homem que superou o asco de ter relações sexuais com uma mulher feia. No discurso reprimido que a piada expõe, nem todas as mulheres devem ser protegidas pela lei, apenas as belas; quanto às feias, elas deveriam considerar o ato como uma benesse.

Uma situação interessante: ontem, eu li uma nota da coluna da Mônica Bérgamo que falava sobre a participação da comediante Sabrina Sato em um baile de carnaval promovido pela revista Vogue:

ME O QUÊ?!
Sabrina Sato apresentou o baile de Carnaval da "Vogue", anteontem. Do palco, ela comentava as fantasias dos presentes. Apontou para uma mulher e disse: "Olha, ela veio de miss... Miss o que, gente? Me esqueci. Eu vim de miss Tupre [me estupre]", exibindo um decote até o umbigo.
*
A festa, no hotel Unique, foi embalada a hits de axé, como "A Dança da Bundinha", que lotaram a pista. (Folha de São Paulo, 26/01/2013 - http://goo.gl/nUemC)

Como toda piada, o comentário de Sabrina Sato traz um discurso reprimido, um discurso que circula meio envergonhado, que sujeito nenhum quer assumir a autoria. O discurso encoberto em questão diz que o estupro, muitas vezes, acontece pelo fato que um desejo reprimido é despertado pela roupa da vítima e se torna incontrolável. Disculpabiliza-se o criminoso - homem, sempre- e culpabiliza-se a vítima.

Ambas as piadas trabalham com o discurso que diz que, no estupro, o último culpado é o homem/criminoso/estuprador. O não-dito é que o estupro só é crime se for cometido contra mulheres bonitas e que se vestem de acordo com padrões considerados pelo homem incapaz de despertar o desejo sexual (fico imaginando que tipo de roupa é capaz de bloquear o libido masculino!).

A pergunta que eu gostaria que fosse respondida é: por que o comentário do Rafinha Bastos chegou até o Ministério Público e por que o comentário da Sabrina Sato não repercutiu?

Nenhum comentário:

Postar um comentário