(*)uma homenagem a dois ex-alunos meus que ironizavam o alto número de disléxicos em uma escola. Sempre que um ou outro aluno faltavam eles diziam “fulano morreu de dislexia)
Quando eu tinha entre 10 e 15 anos, fiz parte ativamente do Movimento Escoteiro. Confesso: achava espetacular. Muito do que eu sou hoje, devo ao movimento escoteiro, para o bem ou para o mal.
Não aprendi a cozinhar. Hoje, por exemplo, tentei fazer um sanduíche gourmet e o resultado foi uma gororoba. (tenho certeza que, em algum lugar, um Ronald deve ter falado “Custava pagar um Mc Lanche?”). Se não aprendi a cozinhar, aprendi a confiar em mim e ser capaz de me virar e superar meus medos.
Antes de entrar no Movimento, eu morria de medo de altura. Se subisse dois degraus de uma escada e olhasse para trás depois, tremia. Hoje não tenho mais medo de altura, só continuo com medo de avião (no ar) e de brinquedos do Hopi Hari (menos o tromba-tromba). Foram as atividades de travessia, carretilha e falsa baiana que me ensinaram a controlar o medo. Mas não o superei instantaneamente, foi um processo longo.
Nas primeiras vezes que tínhamos uma carretilha ou falsa baiana para ir, eu sempre inventava uma desculpa: numas eu falava que tinha, naquele exato momento, machucado o pé; noutras eu era acometido de uma dor de barriga instantânea. Enfim, nenhuma desculpa colava e eu acabava fazendo as atividades. Foi uma, duas, três e na quarta vez já não sentia mais medo.
Mas o que eu quero falar não é sobre fobias, é sobre desculpas. Aliás, nem é sobre desculpas que eu quero falar. Irei com calma.
No último colégio ensino fundamental que trabalhei, percebi que as crianças lançavam mão de um argumento inusitado para pedir um arredondamento de nota ou ainda para justificar o fraco rendimento escolar
“meu filho é disléxico, professor. ele precisa de mais atenção”; “professor, minha mãe falou que eu sou disléxico e então eu tenho direito a uma prova oral”; “professor, a mãe de fulano nos disse que tem um laudo atestando que o filho tem dislexia”; “professor, eu fiquei no pc o dia inteiro antes da prova, mas não tem problema porque eu sou disléxico”
Ouvi tantas vezes as mais variadas tentativas de justificar o fracasso escolar que quando eu me acostumava com uma, outra nova já aparecia. Não quero discutir sobre dislexia de forma vulgar, mas nos tempos em que eu estudava no SESI de Santa Bárbara não havia nenhum aluno disléxico.
Outro momento: certo dia, estava em um restaurante discutindo com outros professores questões relativas à formação do professor. Eu argumentava que um professor deveria estudar durante a graduação Luria, Vygotsky, Bakhtin, Geraldi, Cagliari para que pudessem ter recursos teóricos consistentes para não cair no conto da dislexia. Leitores, as pessoas que estavam à mesa quase jogaram os pratos na minha cabeça. Disseram que era um absurdo os alunos não terem dislexia, porque nada mais podia justificar o desempenho deles do que uma doença e ainda mais: disseram que os alunos podem ter discalculia (problemas em realizar cálculos), problemas em guardar datas (que deve se chamar disdatia) e problemas em ler mapas (que deve se chamar disgpsia). Havia, segundo eles, quase uma doença para cada matéria.
Nem os professores, nem as escolas, nem os pais e, muito menos, os alunos têm uma noção clara do que seja dislexia e acabam criando valores absurdos sobre o assunto. Assim, gostaria de discutir nos próximos posts a questão da dislexia e posso adiantar uma coisa: há muita ignorância e senso comum sobre o tema, assim como muita picaretagem e um pouco de verdade.
quem são as pessoas que morrem de dislexia?
dislechia... deslequicia.... disl... como é que se escreve mesmo?
quem quer ser um disléxico?
Nenhum comentário:
Postar um comentário